quarta-feira, junho 27, 2007

Devaneios evolutivos

Como, para além do trabalho, não tem ocorrido nada de extraordinário esta semana, os meus neurónios vão-se ocupando doutros assuntos menos corriqueiros, como por exemplo mecanismos evolutivos e afins. Apesar de cada vez mais mexer em biologia molecular e DNAs, a abordagem a este tema acaba por ser um pouco darwinista.
Portanto, Darwin... Galápagos... ilhas... É um lugar comum referir as ilhas como laboratórios evolutivos e exemplos, frequentemente em tempo real, das transformações de animais e plantas ao longo do tempo sob efeito de diversos mecanismos de isolamento. Outro lugar comum nestes meandros é referir os tentilhões-das-galápagos (Geospizinae) como o exemplo clássico da evolução, sob a forma de radiação adaptativa.
É possível tecer algumas considerações gerais sobre as diferenças morfológicas que as populações isulares de Aves têm relativamente aos seus parentes em massas continentais:
  1. Aumento do comprimento do bico, de modo a permitir explorar vários nichos alimentares;
  2. Aumento das dimensões corporais;
  3. Diminuição da capacidade de vôo, que pode ir desde a uma mera diminuição do comprimento das asas até à perda completa desta capacidade. Esta transformação é mais comum em alguns grupos de Aves, como os ralídeos, mas ocorreu em grupos tão díspares, como pombos (Dodós e solitários nas Mascarenhas, Natunaornis sp nas Fiji), patos (Anas chlorotis na Nova Zelândia, Gansos subfósseis no Havai), íbis (Apteribis sp no Havai, Threskiornis sp. nas Mascarenhas) ou mesmo poupas (Upupa sp, ilha de Sta. Helena);
  4. Inconspicuidade da plumagem, tornando-se menos colorida, especialmente nos machos.

Portanto é tempo de especular um pouco... vamos imaginar o arquipélago dos Açores daqui a uns 500.000 anos e retirar alguns pormenores da equação (pessoas e espécies introduzidas como cães, gatos, coelhos, cabras, lagartixas e tritões). Pegando nos pressupostos descritos em cima e mais alguns, como seria um guia de campo das ilhas ao fim desse tempo? Infelizmente, a área de cada ilha é reduzida, não permitindo uma grande diversificação de habitats e radiações adaptativas espetaculares como as que ocorreram com os drepanídeos no Havai, mas é o que temos.

Fringilídeos

O arquipélago é habitado por canários (Serinus canarius), verdilhões (Carduelis chloris), pintassilgos (Carduelis carduelis), tentilhões (Fringilla coelebs moreletti) e pelo priôlo (Pyrrhula murina). Dentro de 500.000 anos podia ser habitado por:

Bicos-grossudos-atlânticos (Nesocarduelis viridis e N. megarhynchus). Granívoros generalistas, preferindo sementes de casca mais resistente e habitando zonas abertas e florestas de baixa a média altitude. A primeira espécie ocorre apenas em S. Miguel enquanto que a segunda ocorre em todo o grupo central.




Canário-açoreano (Serinus atlanticus). Granívoro generalista, preferindo sementes de gramíneas e habitando a maioria de zonas abertas e matagais de baixa e média altitude. Ocorre em todas as ilhas.



Tentilhão-da-serra (Fringilla azoricus). Optando por florestas de laurissilva de média a grande altitude, alimenta-se de sementes, frutos, rebentos e alguns invertebrados. Ocorre em todas as ilhas com habitat adequado.

Pintaísco (Carduelis atricapilla). Ocorre apenas no grupo central em zonas abertas, matagais e florestas baixas. Alimenta-se de sementes variadas, rebentos, pólen e folres.




Psitarolo (Pyrrhula psittinus). Finalmente é unânime considerar que o género Pyrrhula tem uma espécie endémica neste arquipélago (isto de o priôlo conseguir vingar até lá). Ocorre apenas em florestas de altitude na ilha de S. Miguel e o bico robusto permite-lhe alimentar-se não só de bagas, rebentos e outra matéria vegetal mais branda, assim como sementes de casca dura.




Não percam as cenas dos próximos capítulos.

5 comentários:

SANDRA SANTOS disse...

Sim senhor...
Bonita aula de Biologia!!
Coisa de quem tem tempo para se dar a Devaneios...
BJS

Fuzhong! disse...

Obrigado, é o que acontece quando o sono nunca mais chega...

Vetoon disse...

Sim senhor! Já começamos a ganhar um bocado de cor....

Anónimo disse...

Isto é q é nao querer trabalhar! Eu quando me dá pra isso é mais bolos...mas esta coisa de pensar em evolução se calhar ainda resulta melhor, leva mais tempo!

Anónimo disse...

Meu Amigo.

Eles também já têm Psittacula krameri... , fico curioso para os próximos capitulos...

Não tens mesmo nada para fazer, pois não...!!!